terça-feira, 24 de setembro de 2013

Confissões de um passageiro

Confissōes de um passageiro

Parar num aeroporto e saber que vou esperar três horas não é nenhum pouco inspirador. Aeroportos são os lugares em que as pessoas não estão ali. 
Mas saber que retorno para os braços e aconchego de quem amo, depois de buscar ajuda e doaçōes para pessoas que aprendi a amar, faz a espera parecer menos dolorosa. 

Hoje, além da gostosa sensação da volta pra casa, lembrei de viagens que fiz com a família quando voar era algo de ficção científica pra mim. Para uma criança do interior, que passava as férias na cada da avó e sítio do tio, avião era coisa de outro mundo. O mundo da imaginação.

Aventura mesmo era o Fusquinha do pai, na estrada que ligava Araçatuba a Auriflama. No trecho de terra, perto Patrimônio da Mata ou Major Prado, era batata contar com uma pausa para sair todo mundo e ajudar o carro a superar o atoleiro. Incrível como o barro e a lama faziam menos mal naquela época.

Senti até o balanço do carro prum lado e o volante para o outro, com seu Benedicto garantindo que tudo ia dar certo. A gente chegaria ainda hoje. E chegava mesmo!

Estou mais chique agora. Acabo de comer um arroz com batata sotê e brócolis, além de mais algumas tirinhas disso e daquilo, perto de pessoas cheias de malas importadas, roupas de grife e celulares iluminados. Tantos destinos esperando tanta gente e eu recordando o carro atolado.

E acredito que essa recordação é meio que um sinal de alerta. Volta e meia sinto alguns aromas, vejo alguns rostos, ouço sons e percebo algo que me remete a um tempo atrás. Claro que isso acontece com todos. Eu sei! Mas os celulares iluminados, que interrompem boas prosas, as malas que carregamos com pressa para conseguir ficar em pé no corredor do avião, a roupa que aponta a conta bancária, não deveriam nos separar da época em que viajar era complicado e chegar era sublime.

Meu nível de nostalgia está bem acima de 12 por 8 agora. Melhor desligar o tablet. Olhei para ele e senti falta da máquina de datilografar. Aí já é demais...


quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O dia em que o mundo parou

No 11 de setembro, 12 anos atrás, eu estava em Cascavel, no Paraná, numa sala da Unioeste, a Universidade onde eu trabalhava. Na verdade, já em clima de despedida. Naqueles dias eu  tinha aceitado o convite para mudar pra Rondônia com a família. Me preparava para o desafio de colaborar na instalação, montagem e início de trabalhos de uma rede de televisão. Começaria por Ji-Paraná, para onde nos mudamos pouco tempo depois do dia em que o mundo parou.

Lembro-me bem dos prédios em chamas e de todo o drama da cobertura jornalística com imagens e textos jamais imaginados. Se bem que o que mais me lembro, e até hoje me causa repulsa, foi ver e ouvir alguns colegas vibrando com a tragédia. Comemorando a ação terrorista. Aplaudindo as torres em chamas e o que chamavam de vingança contra o império, contra o capitalismo. Coisas do tipo.

Aquele foi um dos silêncios mais dolorosos que já calaram minha boca e alma. Não entendo até agora como foi que travei por completo. Quero acreditar que a dor da imagem, com seu ineditismo e furor, devem ter  me anestesiado a tal ponto que não consegui retrucar os torcedores de plantão. Gente que celebrava a morte de inocentes como quem celebra um gol em final de Copa do Mundo.

Por favor não me venha apontar as mortes de inocentes causadas pelos Estados Unidos da América. Eles que paguem pelos seus muitos erros. Morte de inocentes nós também temos. Nas favelas, nos corredores de hospitais abandonados, nas periferias cheirando crack, nas praças prostituídas, nas agências bancárias explodidas, nas escolas invadidas, na solidão do quarto que violenta e cala, nas estradas alcoolizadas ou no cano de uma arma empunhada por mãos que nasceram há pouco mais de 12, 14, 16 anos.

Nada justifica o terrorismo. Como nada justifica a violência que comentei logo ali. Mas, pense comigo, pode se justificar o prazer em ver a morte alheia? Como ainda me dói recordar a celebração da morte distante, como se ali não estivesse presente um de nós.

Claro que o título lá em cima é um exagero. O mundo não parou. Parece-me que nem para pensar ele parou direito.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Você sabe com quem está falando?

No filme O Informante, Al Pacino interpreta um jornalista em crise. Sua ética é colocada em xeque quando uma reportagem bomba sobre a indústria do tabaco deixa de ir ao ar. Comprometendo a promessa que fez ao entrevistado e sua própria história na televisão. É um daqueles bons filmes, com  algo a mais. Num determinado momento o personagem fala sobre a fama e desabafa: Tire o nome da empresa do meu nome e simplesmente desapareço.  Existo porque depois do meu nome vem o dela…

É fato! Durante muito tempo e por uma série de razões, existimos porque ao nosso nome é acrescentada a instituição tal, ou empresa x,  igreja y, entidade z. Sou o Fulano, da…, ou essa aqui é a Cicrana, do…

Carregamos nome, sobrenome e um outro nome. Claro que isso tem um lado positivo. É nossa identidade profissional. Com ela apresentamos quem somos e o que fazemos. Muito do que vem após o nome demonstra também o que cremos ou a razão de estarmos realizando determinado trabalho.

O peso do desabafo no filme tem um outro sentido. E nele me apego para desabafar também. Principalmente por causa de pessoas que carregam após o nome não somente a marca ou o peso institucional ou corporativo. Preferem arrastar as correntes da arrogância. A genética da prepotência. O DNA da luxúria e a soberba do sou-mais-e-melhor-que-você.

O lamentável é que quando chegam nesse estágio, se esquecem que ao ser retirado o nome da marca após seu nome elas podem desaparecer. Ou seja, não é a sua história, sua própria identidade, seu desempenho como gente, sua contribuição para a humanidade, seu zelo como amigo, seu amor ou humanidade que ficaram. A pessoa que havia ali foi substituída por um crachá no peito e uma sentença na cabeça. E de repente volta a ter nome e sobrenome, como qualquer mortal, só que sem vida.


Minha prece é para que meu crachá seja sempre menor que meu coração. O cargo menor que a função. E o respeito ao próximo, com ou sem nome de empresa no final, mais profundo que o status ou a fama. Que desaparecem também. A não ser que a imagem tenha luz própria. E sirva para iluminar a vida dos outros.